quinta-feira, 21 de outubro de 2010

As estratégias do fascismo e a candidatura Serra.

Rodrigo Guéron

Paul Virilio, filósofo e arquiteto francês, conta no seu livro "Guerra e
Cinema" que as primeiras fotos que correram o mundo com alguns dos horrores
dos campos de concentração nazistas foram distribuídas por ordem do próprio
Goebbels, ministro da propaganda de Hitler. Em seguida, Goebbels divulgou
uma nota à imprensa do mundo inteiro declarando-se "horrorizado com o tipo
de propaganda que fazem contra nós estes comunistas e judeus".

Enquanto John McCain, o candidato conservador à presidência dos Estados

Unidos, recusou alguns ataques fundamentalistas a Obama em certos momentos
da campanha eleitoral, no Brasil José Serra alimenta e navega satisfeito na
onda de difamações, calúnias e terror psicológico contra a candidatura Dilma
Roussef. Sua campanha, depois de trazer o fundamentalismo religioso para o
debate eleitoral, de colocar sua mulher na rua dizendo que a Dilma "mata
criancinhas", usou uma manchete mentirosa do Globo que dizia que a Dilma ia
assinar um documento contra a União Civil Gay (o que não aparecia no próprio
corpo da notícia) para posar de " liberal" e dizer que era a favor dessa
união.

Ontem, a polícia federal entrou numa gráfica que imprimia mais de 2 milhões

de panfletos que acusavam a Dilma de "aborteira", falsamente assinados pela
CNBB, mas feitos por ordem de um bispo ( com dinheiro de quem?). Enquanto
isso Serra e Tasso Jereissati ( que acaba de ser derrotado na eleição para
senador) iam a uma missa no Ceará onde panfletos semelhantes eram
distribuídos ( neste caso diziam que a Dilma era " aborteira", que tinha
ligações com as Farcs, era corrupta etc e tal). Um padre se indignou, disse
aos fiéis que aqueles panfletos não tinham nada a ver com a igreja e com
aquela celebração ( que era para São Francisco...). Jereissati então começou
a ofender o padre, chamou o de "padre petista" e militantes do PSDB foram
atrás do religioso que teve que sair da igreja protegido.

Quando Lula reclamou dos ataques que Dilma tem sofrido da imprensa, quando

disse que esta age como partido político e que tem candidato, mas se
apresenta como "imparcial", foi acusado de ser "contra a liberdade de
imprensa". Por outro lado ninguém viu no jornal Nacional, nem no Globo, nem
na Veja (uma pequena nota na FSP), que Serra mandou desligar a câmera numa
entrevista para a jornalista Marcia Peltier, dizendo que aquele tipo de
pergunta não respondia, que ia embora e era para fingir que ele não tinha
estado ali. As imagens do Serra fazendo isso foram entregues ao próprio pela
direção da CNT ( que vergonhoso gesto para um jornalista...), mas o áudio,
gravado no celular de um outro jornalista que estava na platéia, está na
rede.

Imaginem se fosse a Dilma que tivesse mandado desligar a câmera? Íamos ver

as imagens repetidamente no Jornal Nacional e similares durante dias. Dilma
é então acusada de ser uma "ameaça a liberdade de imprensa" por aqueles que
censuram, manipulam e até inventam fatos contra a sua campanha. O fascismo
sempre agiu assim, acusa os outros do que está fazendo. Goebels, como vimos,
pousou de vítima dos judeus e comunistas que estava exterminando.

Dilma também foi acusada, no início da campanha, de "mandar preparar dossiês

contra Serra e a sua família": dossiês que ninguém leu. Enquanto isso os que
fizeram essa acusação despejam um dossiê gigante e ininterrupto de calúnias
contra ela. A tática de propaganda fascista é esta da confusão, da acusação,
da repetição de uma mentira sistemática até virar verdade, da demonização e
escolha de bodes espiatórios. O fascismo é violento não apenas porque mente
e cassa a palavra das pessoas ( como houve com Maria Rita Kehl, demitida do
Estadão apenas por ter escrito que a elite brasileira não admite que os
votos dos pobres tenham o mesmo peso que os dela); é mais do que isso: o
fascismo usa uma estratégia de afetos de medo e ódio, disseminando-os de
forma que cada uma das pessoas se torna não apenas vítima, mas agentes mesmo
deste afetos: é uma mobilização política que passa por dentro dos corpos,
dos desejos, do sistema nervoso das pessoas, e ganha essa dimensão macro
porque é antes micropolítica. Fascismo não é apenas proibir as pessoas de
dizer ou fazer algo, fascismo é forçá-las a falar e fazer algo.

Cada uma das grandes corporações de comunicação do país, onde predominam 4

ou 5 famílias oligárquicas ( os Marinhos, os Frias, Os Mesquita, os
Civita...) foi fundamental na mobilização entre as classe médias e as elites
que levou ao golpe militar de 64, com uma estratégia muito semelhante a
usada hoje pela campanha Serra. A exceção é a não menos proto fascista
revista Veja, simplesmente porque não existia na época. Estes grupos
cresceram e se solidificaram no Regime Militar, enquanto os que se opunham
ao Regime desapareceram ( por exemplo o "Ultima Hora", e também o " Correio
da Manhã" que chegou a apoiar o golpe mas começou a fazer oposição aos
militares logo depois). Ainda nesta tática de confusão da propaganda, estas
corporações de comunicação apresentam-se como grandes vítimas da ditadura.
De fato, a partir do final de 68, no AI-5, instalaram-se nas redações
censores oficiais do regime. Mas antes, nos primeiros quatro anos que se
seguiram ao golpe que ajudaram a promover (entre 64 e 68), cada um desses
"veículos de comunicação" apoiava e promovia a onda de prisões e cassações
que acontecia entre líderes políticos, sindicais, professores (expulsos das
universidades) e assim por diante . As organizações Globo, como sabemos, foi
mais longe de todas: de 1966 até o início dos anos 80 lia um editorial todo
dia 31 de março no Jornal Nacional relembrando e apoiando a " os ideais da
revolução de 64" .

É esta gente e esta estratégia que quer derrotar a qualquer preço a

candidata Dilma Roussef

E aqui talvez para não abusar do leitor, eu deveria encerrar meu texto. Mas

não consigo não acrescentar mais um parágrafo para falar do quanto o golpe
de 64 teve a ver com o ódio e o medo que causava nas elites a participação
de trabalhadores na política que na época crescia a cada ano (o discurso da
"ameaça da república sindical" repetido por Serra agora), de como o Brasil
começava a se democratizar e os sindicatos conseguiam alguns ganhos para os
trabalhadores, do fato do problema de origem escravocrata da concentração da
terra ( e das relações de trabalho) ter sido colocado em questão pelas ligas
camponesas e como Jango foi acusado de "comunista" por ensaiar um tímida
reformas agrária, e de como Paulo Freire (um dos primeiros intelectuais
presos depois do golpe) sofreu a mesma acusação por liderar um programa que
alfabetizou 400 mil pessoas em Pernambuco, e assim por diante. E o mais
notável: como que nos anos de grande crescimento econômico do regime militar
a miséria do país só aumentou? Como o Brasil terminou este período como a
nação industrializada mais desigual do mundo?

Não dá para separar a violência política do regime militar da violência do

modelo econômico. Assim como não dá para separar a violência contra a
candidatura Dilma da violência contra os pobres; e também da violência
contra as mulheres; a propósito foi no governo Lula que foi criada e
aprovada a lei Maria de Penha.

Não há neutralidade possível nas eleições do dia 31 de outubro para quem

busca um Brasil mais justo, solidário e democrático.

Dilma Presidente!


Rodrigo Gueron é Filósofo e Cineasta.

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